sexta-feira, 6 de março de 2015

O VENTO


Em um balanço branco, de dois lugares, estou sentada a observar um jardim. Um jardim e sua diversidade. Paro uns instantes e penso neste mesmo lugar esverdeado e florido, quando ainda não era o que é. Barro vermelho e aterrado, mas que na sua essência, também era belo. Pastoso, pedregoso, seco ou com lama, alaranjado vibrante.
Ali, pronto para a qualquer momento, ser modificado, transformado. A sua frente um muro, atrás, uma casa. Quem sabe uma piscina ou calçamento seria uma boa ideia? Nem um e nem outro. Apenas sementes e paciência. Herdei do meu pai, esse amor pela natureza. De ver além do que ela apresenta.
Ele sempre me explicou que tem tal planta deve ser posta abaixo de outra, pois não gosta de calor. Aquela outra que por se desenvolver mais, precisa ser replantada do vaso para um espaço maior. Ainda aquela que prefere uma terra mais úmida e que combina com a beira do rio. Essa frutífera perto do muro, para conseguirmos colher quando der frutos. Talvez perto de onde os pássaros gostam de cantar, para que tenham alimento...
A grama a crescer, esperando ser aparada. Árvores, de tronco fino, comprido, enrugado ou liso. Com outras flores penduradas. Folhas coloridas, formatos variados, cheiros diferentes, texturas distintas.
            A semente germinando tanto nos ensina: o cuidado com a terra, o adubo, o tempo certo para plantar. Depois, o sol, a chuva, as pragas. Como viveriam somente de sol, se é com as tempestades que crescem? A água infiltrada, o vento dando a forma.
O vento... Estou quase chegando à conclusão que as melhores ‘coisas’ são como o vento. Não a vemos, apenas as sentimos – como sentimentos sem descrição.
E ainda sentada a observar um jardim, o comparo com uma família ou com a vida comunitária. Onde cada um(a) tem seu jeito, formato, dons e limitações, mas que com paciência e se ajudando mutuamente, crescem e progridem juntos. E o mais fascinante... Tornam a vida mais bela, tipo como o vento, sem descrição.


Aline Ruediger – Fevereiro/2015


POUSO EM SI

 
 Na minha poesia
 Meus porões 
 Janelas e cantos.
 
 É preciso espera
 Até que tudo seja desnudado.
 Tal semente da fruta
 Tal nome de quem se aproxima.
 
 A moldura esconde imperfeições 
 A insônia traz-nos companheiras
 E nuvens escuras no céu 
 Se desmancham.
 
 Passos esperados
 Adjetivos redundantes
 Tocam suave
 Qual o colorido das 
 Asas que pousam na rosa.
 
 De meus apegos
 Tomo posse sem remorsos,
 Perdendo tudo e possuindo
 Mesmo que por alguns instantes.

(Rosa Ramalho, fsp)


APAIXONE-SE PELA VERDADE!



Tive uma fase na vida, que cansada de justificar e argumentar algumas coisas, eu mentia. Não lembro bem, mas era pré-adolescente, talvez com uns 11 anos. Tudo começou com uma mentirinha de nada, que foi tornando proporção e que chegou num momento que eu já não sabia o que havia mentido. Ao mesmo tempo que eram situações complicadas, estarei mentindo se disser que não era divertido. Talvez fosse divertido pelo embaraçamento que aquilo causava e também pela minha criatividade de reinventar outra mentira e mais outra e outra.
Mas se tratando de mentir uma ou outra coisinha a meu respeito, é diferente de mentir para ou de alguém – especialmente quando se trata de mentir para si mesma. Quando acima cito que tudo começou com uma mentirinha, trago como exemplo a mentira da minha idade, quem sabe a descrição do lugar onde moro e etc. Mentiras aparentemente tolas, mas que se tornavam uma bola de neve que não derretia rapidamente.
Quando dei por mim, que estava mentindo demais e que aquilo fazia mal a mim e as pessoas que eu convivia, já havia passado um ano. E aprendi que mentir é feio, da maneira mais trágica possível.             
Ali, no auge do ‘descobrimento do mundo’, apaixonei-me por um grande amigo – aquele tipo que te faz despertar novos interesses, apresentando novas bandas, novos amigos, fazendo você tomar gosto por outro estilo de vida, cultura... Te levando a festas, convidando para viajar e sendo parceria em todos os momentos. Apaixonei-me e nossa amizade foi seguindo em frente. Foram anos de cumplicidade, mas nada além de amizade. Ele dizia que a amizade é um amor que nunca morre e que poderia me magoar e vice-versa e apesar de termos tido vivido muitas situações, o respeito e o carinho mútuo permaneciam.
Cadê a mentira nesse episódio tão inocente e singelo? Por aquelas tantas histórias e andanças, conheci muita gente! Pessoas que passaram por minha vida e deixaram marcas na maneira de ser e de levar a vida... Jovens e adolescentes de cidades diferentes e que se encontravam virtualmente ou combinavam algo toda semana.
Indas e vindas, comum em qualquer grupo que convive e se relaciona, tiveram ocasiões de conflitos, seja por ciúme, inveja ou divergências de opiniões – mas, friso e faço valer, as partilhas de vida, as fotografias, os aprendizados, as novidades, inúmeras vezes o sorriso, a música, o filme, o abraço, o consolo e a diversão.
Com os sentimentos aflorados e até devido a felicidade que sentia por fazer parte de uma turma tão dinâmica e cheia de diferenças parecidas, eu costumava dizer “Eu te amo” para todo mundo. Claro que era todo mundo que eu gostava e queria perto de mim... Porém, um longo tempo depois, quando declarei meu amor por esse amigo, ele me respondeu direto e objetivamente: “- Eu posso acreditar nisso? Você diz que ama todo mundo!”
Obviamente que a conversa não terminou ali. Ele pôs-se a contar suas experiências passadas, a importância de discernir o que verdadeiramente sentimos e de como a verdade dita com compaixão é capaz de fazer-se apaixonar por ela.

Aline Ruediger – Dezembro/2014